O Cirurgião-Dentista fazendo uso de suas atribuições legais poderá prescrever quaisquer classes de medicamentos de uso interno e externo, necessários ao seu tratamento em Odontologia e na saúde geral de seus pacientes.
O ato da prescrição médica na Odontologia, além de fazer parte da etapa final do diagnóstico nosológico, requer o pleno conhecimento de farmacologia, tais como fases: farmacêutica, farmacodinâmica e farmacocinética, efeitos adversos, interação entre compostos, etc.
Essa prerrogativa está garantida pela Lei Federal 5081/66, nos respectivos artigos:
II – prescrever e aplicar especialidades farmacêuticas de uso interno e externo, indicadas em Odontologia;
VIII – prescrever e aplicar medicação de urgência no caso de acidentes graves que comprometam a vida e a saúde do paciente.
Cabe ressaltar que a lei menciona claramente o termo “indicadas em Odontologia” e não “restritas estritamente” a mesma, o que permite a prescrição de qualquer medicamento.
Ainda assim, mesmo a legislação sendo clara em relação à plena legalidade das prescrições medicamentosas em Odontologia, observa-se com freqüência a ocorrência de negativas ou tentativas de dificultar a venda de medicamentos por parte dos farmacêuticos, alegando que determinado medicamento não pode ser prescrito pelo Cirurgião-Dentista, pelo fato de o mesmo não ter comprovada a respectiva indicação na área da Odontologia.
No entanto, sabemos que esse argumento não possui respaldo em nenhuma legislação brasileira, pois não é da competência dos farmacêuticos interferir no ato da prescrição de profissionais legalmente habilitados (médicos, Cirurgiões-Dentistas e médicos veterinários), questionando a sua finalidade e sim, somente no ato da dispensação dos medicamentos prescritos.
Sabemos que a Lei 5991/73 no Artigo 15, define que é responsabilidade do farmacêutico a dispensação de medicamentos prescritos por profissionais habilitados e que a recusa injustificada pode ser considerada infração sanitária.
Já o Código de Ética da Profissão Farmacêutica, na Resolução 596/2014 do Conselho Federal de Farmácia (CFF) diz: “O código de ética determina que o farmacêutico deve respeitar as prescrições de profissionais legalmente habilitados”.
Assim sendo, o farmacêutico que se nega a dispensar um determinado medicamento, cuja prescrição cumpra os requisitos legais de preenchimento, sob o simples e único argumento de o medicamento não ter indicação na Odontologia, comete diversas infrações éticas e administrativas, pois fere o livre exercício profissional (Artigo V, Inciso XIII da Constituição Federal), podendo ainda ser enquadrado em infração disciplinar por exercício ilegal de auditor da Vigilância Sanitária (Artigo 47 do decreto Lei 3688/41) ou até mesmo em crime contra à Saúde Pública prevista no Código Penal / Artigo 132:”Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo eminente”).
Nesse caso, a orientação para o Cirurgião-Dentista que tenha uma prescrição medicamentosa negada erroneamente por tais motivos citados acima é de buscar um diálogo pacífico com o farmacêutico, no intuito de apresentar ao mesmo a legislação pertinente, porém se mesmo assim não houver um entendimento, o mesmo deverá tomar as atitudes cabíveis junto aos órgãos competentes, formalizando uma denúncia no Conselho Regional de seu estado e Ministério Público para apurar os fatos, além de registrar um Boletim de Ocorrência (B.O), podendo ainda entrar com uma ação civil de indenização por danos morais junto à farmácia ou farmacêutico, pois como já mencionado nesse artigo, a negativa por parte do profissional farmacêutico, fere as respectivas leis federais supracitadas e ainda poderá configurar crime contra a Saúde Pública previsto no Código Penal ( CP) brasileiro – Artigo 132, além de provável infração por exercício ilegal de auditor da Vigilância Sanitária (Artigo 47 do decreto Lei 3688/41) .
A especialidade de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (CTBMF) é uma área da Odontologia regulamentada pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO), com caráter inegavelmente médico-cirúrgico-sistêmico, reconhecida por sua atuação em ambientes hospitalares, centros cirúrgicos, UTIs, e na condução de casos de alta complexidade envolvendo o terço médio e inferior da face, base do crânio, trauma crânio-facial, neoplasias, reconstruções, além de integração sistêmica com especialidades médicas como anestesiologia, medicina interna e neurocirurgia.
O especialista em CTBMF é submetido a um rigoroso programa de residência multiprofissional hospitalar de 3 a 4 anos (Regulamentada pela Portaria Interministerial MEC/MS nº 1.001/2004), com mais de 10.000 horas de treinamento intensivo, envolvendo:
- Clínica médica aplicada à cirurgia;
- Farmacologia médica hospitalar;
- Semiologia e propedêutica médica;
- Práticas anestésicas e emergências clínicas;
- Atendimento em centro cirúrgico, pronto-socorro e ambulatórios médicos.
Essa formação confere ao Cirurgião e Traumatologista Bucomaxilofacial um perfil técnico que transcende os limites tradicionais da Odontologia clínica, habilitando-o para condutas terapêuticas de caráter sistêmico e de abrangência clínica ampliada, o que justifica a prescrição de qualquer medicamento que seja pertinente ao tratamento empregada, seja em âmbito de regiões como cabeça, face, boca e pescoço ou de modo sistêmico no organismo como um todo, visando a saúde dos pacientes em questao.
Assim sendo, cabe ressaltar que mesmo a legislação sendo clara em relação à plena legalidade das prescrições medicamentosas em Odontologia e principalmente nessa área complexa que é a Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (CTBMF), observa-se com freqüência a ocorrência de negativas ou tentativas de dificultar a venda de medicamentos por parte dos farmacêuticos, alegando que determinado medicamento não pode ser prescrito pelo Cirurgiao Bucomaxilofacial, pelo fato do mesmo ser Cirurgião-Dentista, e muitas vezes a prescrição não ter comprovada a respectiva indicação na área da Odontologia.
Outras especialidades da Odontologia também mergulhadas no contexto médico- sistêmico é a Estomatologia, também conhecida com o sinônimo de “Medicina Oral”, na qual trata do diagnóstico e tratamento de patologias sistêmicas que acometem a região do aparelho estomatognatico e corpo humano e também as especialidades de Harmonização Orofacial e Odontologia Hospitalar nas quais o arsenal terapêutico de tratamento medicamentoso se mostra amplo.
Classes Medicamentosas pertencentes a medicamentos controlados constantes na Portaria 344/98 Anvisa:
Como destacado, o cirurgião dentista possui a evidente prerrogativa legal de prescrever qualquer classe de medicamentos que seja conveniente ao seu tratamento, em acordo com o diagnóstico estabelecido, sendo o responsável por sua prescrição e respectivo tratamento.
Assim sendo, destacamos a título informativo, algumas classes medicamentosas disposta na portaria 344/98 da Anvisa que possuem aplicabilidade em Odontologia :
• Classe C2 (Retinoides de uso sistêmico, como a isotretinoína, tretinoína, acitretina, adapaleno, bexaroteno): Possui aplicabilidade em casos de reparação óssea alveolar e craniofacial em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial , e controle de sialorreia intensa, e preparo dérmico prévio em pacientes na especialidade de Harmonização Orofacial (reconhecida pela Res. CFO 198/19).
• Classe B2 (psicotrópicos anorexígenos): Tem aplicabilidade em dores neuropáticas orofaciais e disfunções temporomandibulares refratárias;
• Classe C3 (substâncias imunossupressoras): Possui aplicabilidade em aftas orais recorrentes.
• Classe C4 (antirretrovirais): Pode ser utilizado como manejo de manifestações orais em pacientes HIV/AIDS;
• Classe C5 (Esteróides peptídeos anabolizantes): Estão previstos na Lei 9.965/2000, com uso em CTBMF para regeneração óssea, prevenção de sarcopenia e cicatrização pós-operatória;
• Psicoativos (Anfetaminas e derivados): Podem ser aplicáveis em dores neurogênicas e quadros refratários de dor orofacial;
• Análogos de GLP-1 (Semaglutida, Liraglutida, Tirzepatida): Possui aplicabilidade no manejo da obesidade e síndrome metabólica, fatores de risco diretamente relacionados a doenças periodontais; atenuação e estabilização de quadros metabólicos hiperglicêmicos no pré e pós cirúrgicos em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial e no tratamento da Sindrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) na área de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial;
• Pomadas e cremes vaginais contendo antimicrobianos, antifúngicos e anti-inflamatórios): Pode ser utilizados em mucosas orais e cervicofaciais pela identidade histológica dessas regiões.
Esses exemplos reforçam a abrangência legal e amplitude sistêmica das prescrições de quaisquer medicamentos em Odontologia, pois a mesma se mostra integrada ao cuidado global da saúde dos pacientes, inclusive nas prescrições de forma “off label”.
No entanto, destacamos que qualquer prescrição de medicamentos é de responsabilidade do seu prescritor, portanto o conhecimento aprofundado dos mecanismos de ação qualquer fármaco prescrito é fundamental.
Assim sendo, o Sindicato de Odontologia do Rio Grande do Sul,(SOERGS) estará abrindo um canal de denúncias nas quais os profissionais da Odontologia que tiverem suas prescrições negadas indevidamente, poderão entrar em contato para que os fatos sejam firmemente apurados e as medidas cabíveis junto aos órgãos competentes tomadas.
Por fim, destacamos as leis federais são claras na afirmação de que os únicos profissionais que possuem a prerrogativa de prescrição de medicamentos para uso humano no Brasil, são os portadores de registros em CRM e CRO (médicos e cirurgiões dentistas), ao mesmo tempo que as mesmas, não expressam em nenhum momento nenhuma diferenciação hierárquica de uma categoria profissional sobre a outra, pois ambas são legalmente detentoras da possibilidade de emissão de diagnóstico e prognóstico nosologicos (doenças) em suas áreas de atuação.